Roupas de baixo no século XVIII
- Juliana Lopes
- 7 de nov. de 2024
- 4 min de leitura
Saiba o que você precisa para começar a construir seu guarda-roupas histórico!

A lingerie está diretamente relacionada à intimidade feminina, e antes de ter uma função de sedução, sua função era primeiramente funcional. As roupas de baixo tinham como objetivo proteger o corpo do frio, criar um um suporte para a silhueta e auxiliar na higiene, visto que eram as peças lavadas com maior frequência. A roupa de baixo acompanha a evolução da história da moda e por isso cada período apresenta características bem distintas. Mas então o que era usado por baixo das roupas do século XVIII? Tratamos do assunto a seguir:
Chemise

A chemise é a primeira peça que entra em contato com o corpo, e no século XVIII consistia de um camisolão longo comumente feito em linho, com nesgas nas laterais, decote profundo e mangas na altura do cotovelo. Era a peça que protegia as roupas externas da oleosidade do corpo e portanto era uma das peças lavadas com mais frequência. Até a metade do século era comum partes da chemise ficarem à mostra, como um detalhe do traje, o que era uma afirmação de classe social, visto que manter as roupas extremamente brancas era algo reservado a uma elite que não precisava trabalhar, e podia ostentar suas roupas sempre limpas.
Stays

Também chamados de pair of bodies ou corpinho, em português, sua principal função era o suporte ao tronco, elevando o busto e proporcionando uma silhueta cônica. Inclusive é analisando esse efeito na silhueta que é possível observar se mulheres estavam usando a peça ou não. E apesar de ser absolutamente mal visto uma europeia ser vista sem stays, no Brasil essa lógica não se aplicava. Era comum ver mulheres que não utilizavam a peça, e elas raramente apareciam em inventários. Os stays eram estruturados com barbatanas de baleia e uma camada de linho engomado, podendo ter forro. Sua aparência variava de acordo com ocasião e classe social, sendo ricamente decorados ou em tecidos lisos. Seu comprimento se estendia do meio do busto até a linha da cintura, onde haviam abas para acomodar o quadril e ajudar a manter as saias no lugar.
Meias

Geralmente feitas em seda ou lã, a modelagem das meias seguia o contorno das pernas e o comprimento geralmente era acima do joelho. Era comum também que elas tivessem bordados próximos ao calcanhar para enfeitar ou reforçar costuras. E, assim como ocorria com as chemises, ostentar meias o mais brancas e limpas possíveis era uma forma de demonstrar status.
Jarreteiras

Para segurar as meias no lugar era necessário usar as jarreteiras, que são como ligas de pernas. Os modelos sobreviventes que vemos em museu são ricamente decorados e o mais comum era que fossem amarradas com fitas, apesar de no fim do século XVIII já surgirem outros tipos de fechos, como fivela. Algumas mulheres usavam apenas fitas de cetim no lugar da jarreteira.
Bolsos

Nesse período, os bolsos dos trajes femininos eram uma peça a parte, vestido sob a saia. Podiam ser decorado com bordados, em tecidos lisos ou até mesmo trabalhados em patchwork. Teoriza-se que essas peças eram uma forma de moças jovens poderem treinar técnicas de bordado, por serem pequenas e não ficarem à mostra, o que tranquiliza em caso de erros. Esses bolsos eram acessados por fendas na lateral da saia e assim as mulheres podiam guardar pequenos objetos pessoais, como lápis, perfumes, e afins.
Suportes para as saias

Para armar a saia e deixá-la na silhueta desejável do período usavam-se dois tipos de suporte: os bumpads e os panniers. Bumpad eram almofadas presas em volta da cintura; garantiam volume de uma forma mais casual e prática. Já os panniers eram peças de uso mais formal, principalmente em bailes, corte e afins. Podiam ser inteiriços como o grand pannier - que era de uso obrigatório na corte de Versailles - ou separado em duas partes como os pocket hoops. Uma mulher em 1746 escreve: ‘Existe muita variedade no modo de se vestir que eu nem sei te dizer como é a moda, a única coisa que parece de uso geral são os panniers enormes”, e esse é apenas um dos inúmeros relatos primários que podemos encontrar sobre essa moda da elite, que chegou a ser tão extrema que algumas mulheres tinham dificuldades de passar em portas ou sentar em algumas cadeiras.
Anágua

Uma camada extra na parte de baixo poderia ser utilizada, como a anágua. Modelos acolchoados eram uma opção para aquecer as mulheres no inverno e acrescentar um volume discreto à saia.
Fichu

Apesar de ser uma das peças que mais aparece do lado de fora, incluí o fichu nessa lista também. O fichu era um lenço de musselina usado no decote, por modéstia ou para aquecer, usado principalmente para saídas durante o dia. Em mulheres da classe trabalhadora, essas peças também eram usadas para proteger a pele do sol.
Um traje histórico é construído de dentro para fora e portanto é importante a pesquisa das peças que vão embaixo de uma roupa para então pensar na construção da parte externa. Da mesma forma, as roupas de baixo também eram essenciais na construção do ‘eu’ do século XVIII, e dão muitas pistas do quem a pessoa é, o que ela faz. Na reconstrução histórica, um conjunto de roupas de baixo historicamente correto te ajuda a ter uma ideia de como era a postura e modo de viver de uma determinada persona histórica.
A minha ideia foi trazer aqui um ponton de partida para os curiosos no assunto, mas recomendo as fontes listadas nas referências bibliográficas para um maior aprofundamento. Para quem busca mais referências visuais, tenho um painel no pinterest só de roupas de baixo do século XVIII: https://br.pinterest.com/julianalopesmf/18th-century-underwear/
Referências bibliográficas:
CUNNINGTON, C. Willet. The history of underclothes. Dover Publications, 1951
WAUGH, Norah. Corset and crinolines, Norah Waugh. Routledge, 1991
JULIÃO, Carlos. Riscos iluminados de figurinhas de brancos e negros
National museums Liverpool. Getting dressed in the 18th century
Esses bolsos foram simplesmente a melhor invenção da história da moda ahahahhaha