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Banyan - Indo além do traje.

  • Foto do escritor: Arthur Adams
    Arthur Adams
  • 7 de set. de 2024
  • 4 min de leitura

Pensar na segunda temporada do Costura Histérica para esse ano me levou a revisar um antigo vídeo sobre o homem vitoriano na intimidade - Nesse vídeo falava sobre trajes usados em casa, para receber visitas e no uso diário domestico e para lazer. E então, lá estava ele como assunto quase que principal; Uma peça misteriosa, cheia de histórias, até com o uso proibido em 1742, que fascina pela simplicidade e efeito, além de cruzar quase quatro século com tão poucas alterações que seria difícil fazer uma linha do tempo.

"Dr. Charles Chauncey, M.D.", 1747, de Francis Hayman (1708-1776).


Natural que uma peça que apareceu em tantos momentos da história tenha tantos nomes: De Banyan dos mercados indianos, "chintz dress/gown" pela importação vinda da china, Schlafen frock pelos pensadores alemães e até quimão usados pelos portugueses para aguentar o calor dos trópicos no Brasil. Temos registro desse traje durante todo o século XVI para o XVII, onde o uso carregado de significados de novos ideiais políticos e até filosóficos se destacava em retratos de pensadores, pintores e músicos. O homem vestia aí a modernidade no seu tempo livre dedicado a estudos, leituras, afazeres políticos e até pronto para visitas mais íntimas. Esses reflexos dos novos tempos, ainda herança do mercantilismo do século XVI, invadiam os propósitos do século XVIII - O novo homem vinha com novos conceitos, paradoxos construídos sobre sua masculinidade e conflitos sociais que se expandiam por toda a Europa e América. O traje longo, solto e amplo ligava por vezes essa ideia de sabedoria anciã dedicada a livros no seu conforto como também a depravação da juventude ansiando pela passagem ríspida da carruagem para o novo século.

Jean Revel (1684-1751), ‘Raphael of silk design’ (1747, Lyon)


Presente nas mais diversas obras - Os retratos do século XVIII são nosso primeiro ponto de partida para entender os efeitos desse traje. Associado a artistas, políticos e pensadores o Nightgown refletia na sua execução e venda um olhar diferente para uma sociedade pré-industrializada. Poder se despir dos trajes formais e ter na chegada em casa uma peça feita com propósito de relaxar eram novos pensamentos para esse momento. Os trajes poderiam ser comprados prontos vindos de mercadores, importados com estética mais próxima dos quimonos asiáticos, que durante o século XVIII já tinham uma versão pensada na venda para a Europa e também um estilo mais elaborado feito por alfaiates em múltiplas partes, com enchimentos e demais detalhes. As referências eram tantas de uso dessa peça que vão da India a China, de Roma a Grécia e até passam pelos otomanos na Turquia. A execução plana do primeiro estilo inspirado nos quimonos nos leva a pesquisas recentes que mostram a execução de trajes masculinos feitos com antigas saias femininas. Uma vez que essas saias eram recortes retangulares que preservavam grandes quantidades de tecidos. Essa primeira ligação entre um traje que aspirava masculinidade com tecidos femininos é reminiscência de uma antiga moda antes do século XVIII e que mostrava uma inexistência da consciência que viria a partir do século XIX de tecidos para trajes de diferentes gêneros. Ou seja, essa interação entre o tecido feminino com um traje que representava masculinidade foi o ponto de estudo de muitos historiadores como Ariane Fennetaux. No Men in gowns, nightgowns and the construction of the masculinity in XVIII century ela discorre sobre as atuações desse traje tão simples e tão complexo na construção da masculinidade durante o século XVIII. Com Artigo linkado clicando aqui.


Modes en Miroir: la France et la Hollande au temps des Lumieres

Tecidos e mais tecidos - Um traje tão amplo que era recheado de sinônimos de nobreza, horas livres e conforto lendo e estudando você já sabe que foi o favorito da nova classe média em ascenção. Mas vale comentar que existiam grupos de homens que usavam o Banyan em público, para ir a café e casas de chá - Existindo até casas chamadas de banyan houses - Em 1713, o The Guardian escreveu: "Os homens estão se mostrando em tavernas em seus trajes indianos sem o mínimo de decoro." Em tradução livre. Esse mesmo traje que podia ser síntese de seriedade e rigor também poderia ser símbolo de juventude e rebeldia - mostrando-se em público numa peça que muitas vezes era apenas vista no momento mais intimo, ao fumar ou receber amigos. Relação por vezes diferente nas terras brasileiras, onde vemos seu uso mais naturalizado principalmente em muitas aquarelas de Carlos Julião no século XVIII e até de Debret no início do século XIX. Reforçando nossa ligação com esse traje que liga os mais diferentes momentos da história.

Banyan ca. 1760. Metropolitan Museum of Art


Nas coleções de museus podemos ver os mais variados tipos de tecidos para construção dessa peça - Nas peças do tardio século XVI os brocados de seda são mais aparentes, durante o século XVII a ascensão do algodão se torna um movimento perfeito para falarmos em outro momento e que liga essa fibra a peças de luxo como o dressgown e durante o século XVIII o desenvolvimento de novas modelagens traz a tona linhos, algodões e sedas nas mais diferentes tecelagens. Comumente vemos esse traje em seda, mas o trabalho de Margaret H. Swain - A Study of Mens' Nightgowns Eighteenth Century - Mostra o uso de linhos e algodão a escolha de muitos homens durante esse período - Seja por aporte político, principalmente na Inglaterra ou o linho pelos franceses. De toda a forma - é ponto que nos ajuda a criar um traje mais próximo da nossa realidade - Forrado ou não e com a escolha pelos tipos de forro e adornos essa peça fantástica ainda vai cruzar todo o século XIX - Nos dando a oportunidade de falar dele mais uma vez no futuro. No Costura Histérica você encontra gratuitamente o molde para seu BANYAN em nossos destaques no instagram ou aqui mesmo pelo site. Podendo ainda conferir tutorial completo com o Paulo Samu. Seja artista, político, sério ou depravado é o momento de você fazer seu Banyan e aproveitar todos os privilégios de estar numa comunidade de costura histórica feita para você. E você, sabia que tinha tanto para refletir sobre um traje tão simples? Um abraço para todos vocês. Arthur Adams.

5 Comments


Viktor
Jan 30

Escrevo uma história e o personagem Morpheus representa toda essa aura de “viver de pijama” eu estava em busca de uma peça de roupa que demonstrasse esse lado do personagem! antes disso eu imaginava ele usando um trench coat ou um roupão..mas não tava satisfeito,Vou usa o banyan como inspiração pra roupa do meu personagem! Vlw

Amei o site descobri vendo o vídeo do tiktok

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Ivny Coura Fotografia
Ivny Coura Fotografia
Sep 11, 2024

Achei bem interessante saber mais sobre este traje, sobre o qual eu sempre leio nos livros. E vendo as imagens, dá pra perceber que havia modelos de vários tipos e estilos. Obrigada por compartilhar conhecimento conosco, Arthur.

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Arthur Adams
Arthur Adams
Sep 13, 2024
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Obrigado pelo carinho, Ivny Não dá pra se imaginar tomando um chá gostoso num desses? 😍

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Guest
Sep 07, 2024

Post super incrível e revolucionário esse post. É sempre bom ter uma fonte tão maravilhosa para nossas pesquisas

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Arthur Adams
Arthur Adams
Sep 13, 2024
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E ainda podendo aproveitar nosso post para fazer um! Abraço apertado! 😍

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